sábado, 22 de dezembro de 2007

Xilogravuras

1- "Eu" - xilogravura, 1985. Este foi um dos meus primeiros trabalhos feito na Oficina de Xilogravura da EBA. Me identifiquei tanto com esta imagem que a chamei de "EU".

2- "Nosferatu" - xilogravura, 1985. Aqui o formato da madeira era comprido e isto me induziu a criar esta figura alongada com capa e cara de vampiro. Daí o título.

3- "O Caçador de Vampiros" - xilogravura, 1985. Para fazer companhia ao vampiro nada como seu caçador, com estaca e tudo. Reparem no sobretudo elegante que ele usa.

4- "O Lambelaska" - xilogravura, 1985. Este grupo nasceu naturalmente. Minha mão guiou a goiva como num desenho cego e daí surgiu este fantástico casal de amantes. O título eu ouvi de um conhecido meu, cearense, que me contou que estava indo a um "Lambelaska". O curioso é que a matriz desta gravura é literalmente lascada.

5-"Hóspedes e Hospedeiros" - xilogravura, 1985. Quem é o hóspede e quem é o hospedeiro? Mais uma gravura que nasceu espontaneamente, sem nenhum desenho prévio.

Na primeira postagem feita neste blog, afirmei que colocaria um pouco de tudo sobre meu trabalho como artista plástico. Portanto, vou fazer uma pausa na pintura e falar agora da minha xilo, que comecei a produzir a partir de 1985, quando ganhei como prêmio, num Salão da EBA, um curso na extinta oficina de xilogravura do MAM (sobre a minha cerâmica e escultura falarei em outro blog, ainda a ser criado).

Na ocasião não me entusiasmei muito com o tal curso pois nada sabia de gravura de um modo geral e de xilo especificamente. Contudo, quando se aproximou a época de iniciar o curso (março de 85), comecei por conta própria a gravar com uma faca a superfície de um pedaço de madeira (extraído do piso da casa do Titã, cachorro da minha família) e, desta forma improvisada, nasceu a minha primeira xilogravura, mostrando uma árvore (nesta época estava pintando as árvores estilizadas, já mostradas aqui). Como desconhecia o processo de tirar cópias, utilizei a técnica do "frottage", colocando uma folha de papel manteiga sobre a matriz toscamente gravada e passando sobre ela um lápis 6B, obtendo uma imagem da tal árvore. Infelizmente perdi esta matriz e sua cópia.

Quando finalmente o curso no MAM teve início, vi logo que estava para me iniciar num processo maravilhoso de criar imagens, cujas características gráficas tinham tudo a ver com meu processo de desenhar e pintar. Imediatamente comecei a produzir uma série de matrizes, tomando como tema objetos simples como cadeiras e árvores, para depois passar às figuras humanas, muitas delas de cunho erótico (pois nesta época, aos 25 anos, este era um momento especialmente "quente" para mim).

Esta foi uma fase muito produtiva, tanto que após a conclusão do curso no MAM, que durou um semestre, imediatamente me inscrevi na Oficina de Xilogravura da EBA, pois ouvira falar muito bem dos professores que davam aula lá. E foi uma ótima experiência, pois somei o que tinha aprendido no MAM e o que estava aprendendo sobre xilo na EBA com minha experiência de pintura, largamente desenvolvida tanto na EBA, enquanto aluno, quanto nos anos anteriores como autodidata.

As xilos desta época são muito diretas, cheias de fantasia, erotismo e humor. Todas elas foram criadas diretamente sobre a matriz, sem desenhos preparatórios, totalmente de improviso. Naturalmente algumas não davam certo neste meu processo tão impaciente; contudo, em sua maioria, surgiam gravuras muito interessantes, vindas diretamente do meu "mar interior". E foi assim, durante uns três anos (de 85 a 89), que produzi gravuras como um "deseperado", diminuindo muito a minha atividade como pintor.

Antes de postar imagens das xilos, quero explicar duas coisas:

1- Comentei acima que a xilogravura tinha (e tem) muita relação com meu processo de desenhar e pintar. Isto acontece porque quando estou criando alguma imagem, em qualquer gênero de arte, privilegio a linha (o desenho) na maioria das vezes, sendo isto uma característica natural minha (é como ser destro ou canhoto). Isto produz resultados com aparêncica "gráfica", onde os contornos são explícitos e as cores são, geralmente, justapostas e contrastantes em diversos graus de intensidade. Portanto, minhas xilos são assim: construídas com contrastes violentos de preto e branco, apresentando linhas grossas e pesadas mas com alguns momentos de sutileza, especialmente nas xilos mais recentes (de 2000 para cá). Vocês vão notar muitas semelhanças entre várias destas gravuras apresentadas aqui com muitas das pinturas já postadas e outras que postarei mais adiante. Há aí uma influência mútua entre pintura e gravura, onde temas, estilo e alguns procedimentos se permutam. A grande diferença entre elas, no meu caso, é que nas xilos não há cor, pois desafio-me sempre a resolver a imagem em preto e branco (enquanto na pintura sou colorista ao extremo).

2- O processo técnico (resumidamente): todo processo de gravura pressupõe a criação de uma matriz onde é gravada a imagem original, da qual se retiram várias cópias numeradas e assinadas. Na gravura em metal (técnicas: "ponta-seca", "água-tinta", "água-forte", "maneira negra") a matriz é de metal, geralmente folhas de cobre ou latão. No caso da xilo a matriz é de madeira ou material parecido (linóleo ou, mais recentemente, MDF). As melhores madeiras para se gravar a matriz são a canela, a massaranduba e outras que possuam fibras bem juntas e sejam bastante duras. Também pode-se utilizar madeiras cortadas em topo, perpendicularmente as fibras, mas este tipo de corte é difícil de se conseguir hoje em dia (assim como as duas madeiras citadas, que estão caríssimas por serem raras).

Para se obter a imagem, deve-se grava-la na superfície da madeira, cirando-se sulcos com instrumentos cortantes chamados de goivas. Após a gravação feita (geralmente a partir de um desenho prévio), aplica-se uma camada de tinta para impressão sobre a matriz (com o auxílio de um rolo de borracha) e sobre esta é colocada uma folha de papel especial para gravura, sobre a qual é exercida uma pressão por processo mecânico (prensa) ou manual (uma colher de madeira pacientemente esfregada) para forçar a passagem da tinta de um para o outro suporte. A camada de tinta aplicada fica apenas nas áreas ao nível da superfície da matriz, não penetrando nos sulcos gravados. Quando a folha de papel é retirada, ela traz impresso todo o desenho que foi gravado na matriz só que virado ao contrário (direita e esquerda se invertem). A esta cópia dá-se um número de série (determinado pelo xilogravador), o título e a assina-se.

Este processo de gravar é muito antigo, tendo sido praticado há milênios na China para estampar desenhos em seda. No ocidente, durante a Idade Média, foi muito utilizado para estampar imagens religiosas em livros manuscritos e para criações de cartas de baralho, os populares "tarots". Grandes artistas desde esta época praticaram a xilogravura como Dürer (no século XVI) ou os expressionistas alemães (no século XX). No Brasil Oswaldo Goeldi foi (é) um dos grandes nomes desta técnica de gravura, tendo sido também professor da Escola de Belas Artes. Outros nomes que podemos citar são os de Adir Botelho, Roberto Magalhães, Rubem Grilo, Faiga Ostrower entre tantos outros, isto sem mencionar os gravadores populares nordestinos para literatura de cordel.

Agora vou passar a postagem das imagens de algumas das minhas xilogravuras (são mais de 300), começando pelas mais antigas, a partir de 1985.